CRÔNICAS

E no urucu não vai nada não?

Em: 02 de Fevereiro de 2004 Visualizações: 7123
E no urucu não vai nada não?
Ele é padre, nasceu em Coari, e provou que tem boca: foi a Roma. Lá, onde mora atualmente, estuda os segredos e os mistérios da vida e de Deus. Vai ser doutor em teologia. Mas continua antenado no Amazonas, tentando decifrar seus enigmas. Enviou, de lá da Itália, um e-mail, sugerindo que o Taquiprati discuta a questão do gás natural do Urucu. Qual o melhor modo de transportá-lo para Manaus? Balsa ou gasoduto? Quais são os impactos sobre o meio ambiente, os cabocos e as comunidades indígenas? O que povo de Coari vai ganhar com isso?
Confesso que não refleti de forma mais profunda sobre esse problema, cujos aspectos técnicos e políticos são bastante complexos. Por isso, tentei falar com o pesquisador da Universidade do Amazonas, Frederico Arruda, possuidor de todas as qualidades necessárias para ser o guru dessa coluna. Ele é brigão, polêmico, criador de casos, bom caráter, íntegro e, sobretudo, dono de uma sabedoria generosa e contagiante. Já que participou, em 2001, de uma audiência pública na Câmara Municipal para debater o tema, pensei:
Ecce homo!
Acontece, leitor, que não consegui falar com o Fred Arruda. Aí, lendo recortes de jornais, vi que a deputada Vanessa Graziottin (PC do B) havia impetrado duas ações populares: uma, pedindo a suspensão do contrato do gasoduto; a outra, contra a doação do Porto de Manaus à família De Carli. Um assunto puxa outro. Decidi trocar de tema. Sobre Urucu, recomendo a leitura dos artigos esclarecedores de Ivânia Vieira e Luiz Tinoco, publicados aqui no domingo passado. Aproveito para atracar, a partir de agora, no porto do De Carli.
PORTO DE LENHA 
Um resumo da ópera. Leitor, por favor me corrige, se estou errado. Olha só! O ex-senador Carlos Alberto De Carli foi nomeado pelo Governo anterior para o Conselho Superior de Navegação, Portos e Hidrovias. Era pago, portanto, pelo contribuinte, com um gordo salário, para fiscalizar as empresas arrendatárias do Porto de Manaus. Foi quando o Governo do Estado decidiu privatizar o porto. De Carli, que representava, em tese, os interesses do povo amazonense, mexeu os pauzinhos em todo o processo de licitação.
Em junho de 2001, um consórcio de empresas ganhou a licitação estadual e se tornou dono do porto. Adivinha, perspicaz leitor, quem foi chamado para presidir o consórcio? Quem? Kem? Adivinhaste. Foi ele, De Carli. “Aí tem truta”, pensou a deputada Vanessa, que apresentou ação popular, questionando a licitação. Suspeita-se que De Carli, em vez de defender o povo, que o remunerava, representou as empresas, que agora pagam seu polpudo salário. O atual governador Eduardo Braga entrou como ´litis consortis´, um termo do latinorum que significa mais ou menos: “Vanessa dixit. Assino embaixo”. 
A partir daí, começou uma guerra de guerrilha: liminares praqui, mandados de insegurança pra lá, data venia pracolá, despachos judiciais, argumentum baculinum, juris tantum, e farina parca caldus piscis meus primundum (Aos poucos leitores que desconhecem o latim, chamo atenção para essa tradução primorosa que fiz, modéstia à parte, da expressão “farinha pouca meu pirão primeiro”, uma contribuição do papai aqui para o mundo da jurisprudência. Para alguma coisa serviu o seminário redentorista na minha formação).
O certo é que a licitação, considerada irregular e fraudulenta, “não cumpriu exigências legais, como a realização de audiência pública para a seleção das operadoras”. Aí, né, Eduardo Braga exonerou De Carli da presidência da empresa Sociedade de Navegação Portos e Hidrovias (SNPH). Aí, né, Paulo Roberto – o Decarlito - filho do Decarlão, criou um tal de Instituto Amazonense de Defesa da Cidadania (IADC), que acusou Eduardo Braga de pagar supersalários aos secretários estaduais. A gente ainda vai falar sobre isso.
PORTO DAS CATRAIAS
Mas até aqui morreu Neves. Nenhuma novidade. Quero, no entanto, refrescar a memória sobre a biografia do De Carli, para que o leitor, sobretudo os mais jovens, saibam quem é que foi escolhido para ser o dono do porto de Manaus, construído pelos ingleses na época da borracha, hoje um patrimônio material, cultural e histórico do povo amazonense.
Quem é o paulista Carlos Alberto De Carli? Kem? Sem nunca ter obtido um voto, foi senador pelo Amazonas montado, como suplente, na garupa do finado Fábio Lucena. É lembrado todas as vezes que o Senado impede o julgamento de um trambiqueiro, como na notícia dos jornais de 29 de junho de 2000:
“O senador paulista Carlos Alberto de Carli (PMDB- AM) também não sofreu qualquer punição do Senado, em 1986, mesmo tendo um extenso currículo envolvendo condenação por estelionato e processos na Fazenda Pública por sonegação de impostos, entre outros”. 
Em dezembro de 1986, o juiz de Direito da 7ª Vara Cível, Arnaldo Carpinteiro Peres, com firmeza e coragem, publicou edital, com prazo de quinze dias, intimando “o sr. Carlos Alberto Di Carli e o sr. Carlos Antônio Di Carli, que se encontram em lugar incerto não sabido, a tomarem ciência da penhora levada a efeito pelo Banco do Brasil S.A”. Naquela ocasião, publicamos uma crônica com o título “Procura-se um senador”.
Se o De Carli, o das Fazendas Unidas, fosse nomeado para administrar o Porto das Catraias, em São Raimundo, o meu amigo bucheiro, o escritor Áureo Nonato, teria um chilique. De Carli poderia passar a perna nos catraieiros. Se sua história não lhe permite – data venia -  sequer administrar catraias, como pode gerir o Porto de Manaus? Convido o leitor a deixar de lado os recortes de jornais e a navegar por outros mares. Aprendi com minhas sobrinhas Ana e Dany, o que é um ´blog´ - um diário aberto que adolescentes mantém na internet.
MEU MUNDINHO
Seguindo as orientações recebidas (tio, deixa de ser burro, clica aqui, clica ali), consegui visitar o ´blog´ de Odara Fagundes, intitulado ´Meu Mundinho´. Qualquer leitor que tenha sobrinhas inteligentes pode conhecê-lo na íntegra, pois está disponível na internet. Vou reproduzir apenas alguns trechos, mantendo a linguagem da autora.
“Sábado, 31/05, fui na festa de 15 anos da Mariana De Carli, no lago sul, em Brasília. Cara, qq foi akilo? Eu nunca pensei q alguém seria capaz de fazer uma festa dakelas.(...). Foi super descolada, parecia q a gente tava no Tahiti: a estrutura GIGANTESCA! Foi no jardim da casa dela, mas q jardim eh esse???? Tinha 3 lagos dentro! Tinha só paty e mauri, claro, mas valew a pena.. Rá, fala sério. A miss-Brasil tava lá, zanzando de um lado pro outro. Daí uma hora eu esbarrei em uma mulher e falei: desculpa e ela: tudo bem, e na hora q olho pra cara dela, kem era? Kem??? A Narcisa Tamborindeguy.. (eh assim q se escreve?)”
“Daí o Nelson Piquet e o filho Nelsinho também tavam lá, mas eu não vi.. Se vi, não reconheci, pq nem sei kem são, só q correm na F1 ou corriam, sei lá.. E o Fernando Pires (o das sandálias) tb tava, e devia ter mta gente chiki assim, mas nem conheço, então... daí teve show do Chiclete..! dentro da festa..! (...). Daí o buffet tava perfeito... desde a hora q começou a festa, até 5:30, hora q foi servido o café da manhã, o buffet continuava incrivel.. São tantos detalhes q nem sei se consigo contar.. parecia a china, indonésia, tahiti, sei lá..Os doces.. nossa.. os doces.. em um certo lugar tinha uma estátua de Buda de uns 5 metros com um altar na frente, no altar flores e mais flores.. e cestos.. dentro dos cestos, flores e mais flores.. e dentro das flores?? Doces e mais doces.. hmmm.. perfeito, perfeito.. coisa de rico mesmo..” 
“Ah, falando nos ricos.. o pai dela (Carlos Alberto De Carli) é ex-senador e dono do porto de Manaus (atualmente eles moram lá) e a mãe, (Carla De Carli) tem um programa na TV... acho q só passa no AM.. e ela deve ter mto, mto mais coisa msm.. ainda bem q ela era amiga da minha mãe na infância... hehe. (...) O pai falou q podia botar o q kisesse na festa, gastar o qto for (qtos milhões, será?) mas não keria imprensa lá dentro”.
Sem comentários. A imprensa estava lá dentro. Se eu fosse o Cirilo Batará, contratava a Odara como repórter. Ela contou tudo o que viu. Por isso, quando o Decarlito, em nome do Instituto Amazonense diz-que de Defesa da Cidadania (IADC) escreve um panfleto, me pergunto:
“Cara, qq foi akilo? Qual é a cidadania que o Decarlito quer defender? Kê kié isso, cara? Será que ele não está defendendo os jardins, os três lagos, o buffet, a festa? Coisa de rico mesmo...”
Nesse caso, IADC pode ser lido como Instituto de Apoio aos De Carli. Perfeito, perfeito...como diria Odara. 
Diante das pretensões do De Carli de se apropriar do Porto de Manaus, termino por onde comecei, formulando a pergunta, bastante pertinente nesse caso: “E no Urucu, não vai nada não?” (Visite o sitewww.taquiprati.com.br Leia a crônica “Procura-se um senador” publicada em 1986). 
P.S¹ – Muitos leitores escreveram pedindo para publicar o conteúdo da conversa do Omar Azize. Uma delas, Maria Auxiliadora, enviou e-mail com letras vermelhas garrafais, gritando: “Publica!”. Peço desculpas, mas o De Carli era a bola da vez.
PS² - O Pão Molhado está morrendo de ciúmes, porque falei na Ana e na Dany e não toquei no nome dele. O Pão Molhado e o Omar Azize ficam agendados para uma próxima oportunidade.

P.S. 3 - E o Lula, governando há 396 dias e não homologou ainda a Terra Indigena Raposa Serra do Sol. Ele prometeu na campanha e até agora não cumpriu..

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